“Sou a favor do tratamento de cães com Leishmaniose de mudança radical no método de combate a doença”

André Luis Soares da Fonseca é mestre em imunologia da leishmaniose e doutorando no assunto além de ser professor de imunologia na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Esse mês, ele deu a sua opinião sobre o tratamento da leishmaniose a revista Cães e Cia.

“Defendemos o tratamento dos cães portadores de leishmaniose haja vista o respaldo técnico e científico do procedimento, além de ser uma conduta habitual na Europa. Assim, quando o primeiro exame de um cão der positivo, o proprietário em vez de ser coagido a entregá-lo para ser sacrificado, deve ser notificado pelo poder publico e tem o direito de fazer a contraprova do exame. Se o segundo exame sugerir a presença do parasito, há ainda a possibilidade do cão não estar doente e de não ser transmissor. Para detectar a presença da doença são necessários exames complementares.

Confirmada a doença, o proprietário deve poder tratar o animal se quiser, ou, então, entregá-lo para eutanásia. Manter um animal doente e não tratá-lo é crime de maus tratos, previsto no artigo 32 da lei de crimes ambientais. O responsável além de oferecer risco a comunidade, fica sujeito a detenção de 3 meses a 1 ano e multa.

Quem opta pelo tratamento deve assinar um termo de responsabilidade pelo acompanhamento do cão durante o resto da vida e precisa contar com a supervisão e acompanhamento de médico veterinário. O veterinário deverá notificar a secretaria de saúde, a qual enviará uma equipe especializada para fazer a varredura na residência onde vive o cão e no seu entorno, já que o flebótomo tem abrangência de vôo de cerca de 200m. Identificados os focos do vetor, deverá ser realizado um controle ambiental e o proprietário deverá ser orientado a fazer o mesmo daí por diante.

É preciso impedir que flebótomos pousem no cão em tratamento para evitar que ele adquira mais protozoários e evitar também o risco de transmissão a outros cães e pessoas. Vários trabalhos científicos são repetitivos em mostrar a eficácia da coleira repelente Scalibor para manter os flebótomos afastados do cão. Vale ressaltar que há também trabalhos atestando que o tratamento contra a leishmaniose diminui a presença do parasito na pele e, portanto, o risco de transmissão.

O avanço da doença no país é conseqüência de orientação técnica inadequada e de falta de conhecimento de muitos fatores relacionados a epidemiologia da doença como a participação de outros hospedeiros, caso dos gatos, ratos e ratazanas urbanas. Por orientação do ministério da saúde, os centros de controle de zoonoses, recolhem os cães e os matam, sem fazer controle do vetor, que só ocorre quando há casos de doença humana. O proprietário do animal eliminado rapidamente coloca outro em seu lugar e o flebótomo vai lá e pica esse também, o qual se torna mais um portador com chance de se tornar um transmissor da doença quando os sinais clínicos se intensificarem. Precisamos mudar radicalmente a sistemática.

O certo é concentrar o combate ao mosquito vetor desde o início. Atualmente esse controle é mais levado a sério somente quando há casos humanos na cidade, o que torna a infestação mais grave.

A maneira de combater os flebótomos também é falha. O uso do inseticida ambiental indiscriminadamente não é mais praticado nem recomendado, mas devemos fazer aplicações desses produtos nos animais. É neles que as fêmeas do mosquito vão buscar sangue, o que os torna o ponto critico da transmissão. Hoje há a tecnologia de aplicação de inseticidas no dorso do animal (pour-on) e das coleiras repelentes Scalibor.

Vários trabalhos científicos têm indicado que a coleira repelente funciona. Por que então o governo não distribui gratuitamente? Se o problema for o alto custo, a patente poderá ser quebrada por se tratar de assunto de interesse de saúde publica, já que a coleira é simples de fazer e a matéria prima barata.

O tratamento de cães com leishmaniose está estigmatizado pelo entendimento errôneo de que é proibido. A portaria interministerial na verdade, proíbe o tratamento com medicamentos da linha humana, mas existem medicamentos da linha veterinária que funcionam. Para evitar situações de constrangimento, é recomendável que o medico veterinário ou quem queira realizar o tratamento proponha, em juízo, isoladamente ou em conjunto com outros veterinários, uma ação ordinária com pedido de liminar para que possa fazer o tratamento sem correr o risco de sofrer um procedimento administrativo por parte do CRMV e dos órgãos de saúde”.

Vamos ficar de olho no assunto e exigir os nossos direitos além de exigir que a saúde pública desempenhe o seu papel. Existe controle da leishmaniose e devemos buscar que todos os envolvidos trabalhem em conjunto preservando a vida humana, mas a animal também. Não é possível que em pleno ano de 2010 a matança em massa ainda seja a melhor forma de controle de alguma doença!

Dra. Vanessa Mollica C.Teixeira
Médica veterinária – UFV
Especialização em clínica e cirurgia – UFV
Mestrado em cirurgia – Unesp – Jaboticabal

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